Separando o joio do trigo
02 de março de 2014 | 2h 09
O Estado de S.Paulo
Há sinais animadores de que as manifestações vão entrar
numa nova fase, com a diminuição do apoio da população, cansada dos atos
de violência cometidos por uma minoria aguerrida que delas se
aproveita, assim como a mudança de atitude das autoridades, que parecem
finalmente decididas a endurecer o jogo com relação aos vândalos.
Alimenta esse otimismo também a nova tática empregada com êxito pela
polícia paulista para isolar e conter os que se dedicam sistematicamente
ao quebra-quebra.
Pesquisa feita pelo Datafolha mostra que desde junho do ano passado,
quando as manifestações - que começaram como protesto pelo aumento das
tarifas de transporte coletivo e depois exprimiram insatisfação contra a
qualidade dos serviços públicos em geral e o comportamento dos
políticos - levaram milhões de pessoas às ruas em todo o País, o
sentimento da população em relação a elas esfriou. De 81%, o apoio caiu
para 77% em agosto e, neste mês de fevereiro de 2014, chegou a 52%. A
rejeição aos protestos, que era de apenas 15%, atingiu agora 42%. Quando
se trata da possível realização de manifestações durante a Copa do
Mundo, a simpatia por elas é ainda menor - 32%. E os que são contra
chegam a 63%.
A população está se dando conta de que sua vontade de fazer sentir
aos governantes o anseio por mudanças, tanto no plano administrativo
como no do comportamento, foi deturpada por grupos violentos, em
especial o Black Bloc. O espetáculo de famílias inteiras saindo às ruas
para protestos pacíficos foi substituído pelo do vandalismo dos que
danificam o patrimônio público e privado, invadindo prédios públicos,
destruindo sinalização de trânsito, depredando bancos e estabelecimentos
comerciais. Os números da pesquisa mostram a recusa de um número cada
vez maior de manifestantes de se deixar manipular por uma minoria cujo
comportamento violento e irresponsável culminou no assassínio do
cinegrafista Santiago Andrade.
A situação pode mudar tanto por causa dessa reação como porque o
governo federal - assustado pela possibilidade de grave perturbação da
ordem pública durante a Copa do Mundo, com prejuízo para a sua imagem e a
do País no exterior - dá mostras de que finalmente percebeu que também a
ele convém estabelecer uma nítida separação entre os manifestantes
pacíficos e os vândalos que enveredaram pelo caminho da ação criminosa
pura e simples. Se um esforço sério já tivesse sido feito para
estabelecer essa distinção, que qualquer análise serena sugeria desde o
início, todos teriam saído ganhando, a começar pelos que devem ter
garantido o seu direito de se exprimir pacificamente. Só perderiam os
baderneiros.
Essa mudança deve ser facilitada pela legislação a ser proposta pelo
governo ao Congresso - supondo-se que ele cumpra a promessa de
estabelecer punição severa para o vandalismo - e pela nova tática
empregada pela Polícia Militar (PM) paulista durante a manifestação "Não
vai ter Copa" realizada no centro da capital. Um "pelotão ninja",
especializado em artes marciais e sem emprego de armas de fogo ou de
balas de borracha, fez o que o mais elementar bom senso e os
procedimentos das melhores polícias do mundo sugerem para esses casos:
isolou o grupo de black blocs e deteve mais de 230 pessoas cujo
comportamento sugeria que poderiam praticar atos violentos.
Tanto bastou para que o protesto da maioria pudesse se feito sem
incidentes. A operação foi um sucesso, segundo a PM, porque permitiu
diminuir os danos ao patrimônio - embora duas agências bancárias tenham
sido destruídas -, o número de civis e policiais feridos e os confrontos
com manifestantes. Para isso colaborou também a convocação pela polícia
para prestar esclarecimentos, pouco antes do protesto, de dezenas de
pessoas cujo comportamento levantou suspeitas em outras manifestações.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, admitiu que o governo
federal pode sugerir aos Estados a adoção da tática da PM paulista. Com
isso, a possibilidade de separar o joio do trigo se torna mais real,
para benefício da sociedade.
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