sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Álvaro Lazzarini - Uma homenagem do Ex-Aluno ao Mestre


Alvaro Lazzarini
Luiz Eduardo Pesce de Arruda
(ex-aluno e Coronel da Reserva da PM)

Ele não pôde correr a São Silvestre em 2013. Contrariando suas expectativas e seu otimismo contagiante, assistiu a passagem de ano internado no hospital.
Dura luta tem enfrentado. Mas a enfrenta com que estoicismo, com que dignidade! Não reclama, não maldiz, não questiona. Continua o mesmo soldado, que tem sido a cada dia de sua rica existência.
O Mestre Lazzarini é um herói de nosso cotidiano.
Filho de operário, decidiu um dia ser cadete da Força Pública. E deixou sua querida Jundiaí natal, para nunca mais voltar. Triste sina, aliás, que nos irmana a todos nós, que somos caipiras, cheios de orgulho e saudade da terra natal,  exilados na cidade grande.
Como cadete, seus instrutores o reputavam modelar. Elegante, inteligente, disciplinado, simpático com as pessoas, humano com os subordinados, bom camarada dos pares, respeitoso sem ser servil para com os superiores.
Sua mãe se preocupava com sua saúde e lhe enviava conselhos para se alimentar bem e se agasalhar do frio do Barro Branco. E demonstrava, a cada pagina, todo o orgulho de ter um filho aspirando ao Oficialato.
Um dia, conheceu Heidi, que se tornaria sua fiel companheira por todos os dias enquanto ela viveu.
Lazzarini concluiu a Academia, serviu em unidades operacionais e foi levado à Assessoria Militar da Secretaria de Segurança Pública. Nos dias turbulentos de revolução, não podia ir para casa. E Heidi, com a prole a tiracolo, ia visitar o marido e levava lasanha para poderem almoçar juntos.
 Lazzarini estudou Direito na PUC de Campinas.
Começou a apresentar modestas contribuições à revista “Militia”. Umas delas, sobre prisão especial, mereceu delicada censura do editor:
– Tenente, seja menos pretensioso. Seja mais objetivo e use menos citações.
Estudando Direito, foi aí que despertou seu desejo de cumprir sua outra missão na Terra, a de Juiz. No começo, Heidi, filha do Desembargador Valentim Alves da Silva, resistiu:
– Álvaro, você já tem uma carreira tão linda, porque mudar agora?
Mas era o que ele queria.
E em 1965, ingressou na Magistratura.
Foi um Juiz impecável, do mesmo modo como foi impecável enquanto Oficial da ativa. Humano, estudioso e responsável.
Íntegro em cada gesto, incorruptível, abalou amizades e despertou a ira dos poderosos, pois nunca admitiu pressões, viessem de onde viessem, que pudessem, de alguma maneira, influenciar suas sentenças.
Orgulhoso de sua condição de Oficial da Reserva, um dia foi ao Quartel do Comando Geral, a pedido do Comandante Geral, em plena efervescência do processo constituinte de 1988.
A sentinela não permitiu que subisse a escadaria:
- Senhor, essa escada é reservada aos Oficiais.
- Mas eu sou Desembargador e estou aqui chamado por seu Comandante!
- O Senhor me desculpe, mas não posso abrir exceção...
- Mas eu sou Tenente da Reserva...
 O rosto do Soldado se iluminou:
- Bom, nesse caso então pode!
Em 1967 já era docente da Academia, Mais que isso, foi, ano após ano, se tornando um ídolo dos Alunos.
Sentado, sem recurso a nenhum apontamento escrito, com calma e tranquilidade, Alvaro Lazzarini discorria sobre os mais complexos temas do direito administrativo com a propriedade de quem parecia dissecar o espírito do autor, Hely Lopes Meirelles. Poucos sabiam, porém, que o Professor Hely também era grande admirador da inteligência, lealdade e reta conduta de seu antigo assistente na Secretaria da Segurança Pública, o Tenente Lazzarini.
As reflexões do Mestre Lazzarini, como num processo catártico, compeliram-no a escrever. Prolífico e elegante erigiu, com o suceder dos anos, uma obra vasta, em que nunca se contradiz, mas se complementa, não se repete, mas se projeta avante, a partir de conceitos construídos nas obras anteriores.
Fruto de uma convicção solidamente enraizada na alma, despretensioso e honesto intelectualmente como em cada gesto de sua vida, lançou, sem nunca haver pretendido, os fundamentos de uma nova área do saber, o Direito Administrativo da Ordem Pública.
Hoje, não há autor, no Brasil ou em Portugal, que trate do tema sem citá-lo.  
Alguns discordam dele. Uns, grandes juristas, debatem com ele, alimentando meritória discussão acadêmica. Outros, por pequenez, inspirada na intolerância ideológica, pela incapacidade de admitir que pessoas inteligentes podem trilhar caminhos próprios com liberdade, não o engolem. Outros ainda, servos de interesses corporativos menores, monitoraram seus passos e o combateram. Amado por muitos, incômodo para alguns, respeitado por todos, mesmo por aqueles que evitam cumprimentá-lo, quando cruzam com ele no lobby do edifício onde mora.
Lazzarini tem um vício e uma paixão, que bole com sua alma, e o faz rir e chorar. Essa paixão tem nome. Chama-se Polícia Militar.
Tendo deixado o serviço ativo, Lazzarini fez mais pelas Polícias Militares que a maioria de nós possamos ter feito, depois de décadas de serviço.
Em um tempo de governantes indecisos e vacilantes, Lazzarini sempre defendeu as polícias militares com unhas e dentes, com clareza, sem reservas ou meias-palavras, usando as armas que melhor domina: a inteligência e a caneta que, precocemente, trocou pelo teclado do computador.
Nunca negou as dificuldades da missão de servir e proteger. Mas sempre assumiu que ama essa Instituição, presente nas cidades estradas e florestas do Brasil inteiro, servindo o protegendo os mais vulneráveis.
Trilhou uma carreira fulgurante. Foi desembargador e chegou à iminência da Presidência do TJ. Mas faltou-lhe um voto. Presidiu então o TRE em período de grande agitação política, na primeira eleição de Lula.
Nesse momento tão complexo, a conduta reta e serena do Magistrado angariou- lhe o respeito de todos os candidatos.
Por amar a PM, e não esconder isso de ninguém, recebeu um carimbo. E pagou alto preço por isso. Mas nunca reclamou, pois sabia exatamente o que fazia.
Seus filhos seguiram suas vidas, e cada qual alcançou aquilo que pretendia. O pai, acompanhando de perto os tropeços e as vitórias, vibrava com cada conquista. Mas Alexandre resolveu abraçar a carreira do pai e, um dia, Alvaro Lazzarini confidenciou, com justo orgulho:
- Meu filho será o próximo Desembargador do Tribunal de Justiça!
Mas um dia Heidi ficou doente. Ela, sua companheira de todas as jornadas, mãe extremosa de três filhos, avó, cantora lírica, uma das maiores conhecedoras de ópera do Brasil e promotora cultura do belo canto, que o secretariava e apoiava, iria deixá-lo. Mas, generosa e serena, recomendou aos filhos:
- Seu pai precisa casar-se de novo.
E Lazzarini, talvez como uma recompensa do Céu por sua vida reta, encontrou Marta, uma dentista inteligente, agradável e bem sucedida. E teve início, ali, uma linda história de amor.
Marta zela pela memória de Heidi com a grandeza e a segurança que só as grandes mulheres podem fazê-lo. E acompanha o seu amado nos momentos de glória, de alegria e, como agora, nos momentos de dor.
Lazzarini está doente. Mas é atleta, foi um dos fundadores do fisiculturismo como esporte no país e nunca deixou de cuidar de sua forma física. Talvez isso explique sua admirável resistência à dor e ao desânimo.
E preserva nele a inteligência aguda, a sensibilidade pela dor alheia e o bom humor, que o faz capaz de rir de suas próprias limitações.
Ele não correu a São Silvestre. Mas sua sobrinha, jovem juíza, correu por ele e lhe presenteou com a medalha que ganhou. E confessou:
- Tio, corri cada metro desta prova pensando em você.
A vida é um dom de DEUS. ELE dá e ELE tira, obedecendo a uma lógica que nós, seres humanos, nunca poderemos compreender em nossa pequeneza. E a hora de cada um de nós só a ELE pertence.
Mas pedimos humildemente ao Pai que a vida de Alvaro Lazzarini seja preservada, que sua saúde seja restaurada para que, todos nós, soldados, sargentos, oficiais da ativa e da reserva, amigos e familiares possamos cercá-lo em dezembro de 2014, em uma corrente de amor e gratidão e, juntos, caminharmos os quinze quilômetros que separam a largada, na Avenida Paulista, nas proximidades da Alameda Ministro Rocha Azevedo, da chegada, defronte ao prédio da Gazeta Esportiva.
E a cada passo iremos recordando juntos tantas histórias. A do policial que atendeu a uma ocorrência em sua casa e que, sabendo que ele era juiz, perguntou se era federado e se pretendia apitar pela FIFA. O aluno que compôs a Canção do Regimento em meio à sua aula, enquanto o outro aluno, cavalariano, via nascer o Hino de sua amada Unidade e chorava emocionado. E a quem o Mestre Lazzarini, divertido, perdoou 15 anos depois no café dos Oficiais da Academia do Barro Branco. De seus embates no Congresso. De suas viagens aos confins do Brasil, para defender a causa das Polícias Militares. A vida dos amigos que já partiram.  As homenagens recebidas, com a modéstia que só os iluminados podem exibir, sem parecer falso.
Hoje, ri quando se lembra de sua estreia como autor jurídico. E concorda que, para um tenente pretensioso, até que foi bem longe.
Alvaro Lazzarini, em plena vida, já é um mito. E as próximas gerações, por todo o sempre, falarão dele com carinho e respeito. Desembargador Alvaro Lazzarini: o Tenente Defensor Perpétuo das Polícias Militares.

04Fev14 – 18:10 h.



Nosso querido Mestre  Dr Lazzarini não está bem de saúde, está internado no
Oswaldo Cruz.

Escrevi esse texto como uma singela homenagem de todos nós – seus ex-alunos
- a ele.

Peço que os Srs analisem o texto e, se julgarem válido, postarem em suas
redes sociais, que alcançam muitos dos ex-alunos e admiradores de nosso
Professor, um grande e corajoso defensor das Polícias Militares.

Abs e muito grato.




               Luiz Eduardo Pesce
               de Arruda

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