Como andam seus telômeros?
Em sua coluna na CH de abril, o bioquímico Franklin Rumjanek
fala sobre estudos que mostram impactos do estresse crônico em nível
molecular.
Por: Franklin Rumjanek
Publicado em 26/04/2013
|
Atualizado em 26/04/2013
Novos estudos associam o estresse ao encurtamento dos
telômeros, reforçando o papel dos fatores externos no organismo. (foto:
carl dwyer/ Sxc.hu)
Estudos recentes mostraram que, além das marcas mais visíveis no
corpo, o estresse crônico nos afeta em nível molecular, encurtando o
tamanho dos telômeros, o que parece valer também para outros animais. Os
telômeros são as regiões que se encontram nas extremidades dos
cromossomos.
Além das marcas mais visíveis no corpo, o estresse crônico nos afeta em nível molecular, encurtando o tamanho dos telômeros
Devido às peculiaridades da enzima DNA polimerase envolvida na
duplicação do DNA, que ocorre antes da divisão celular, se não houver
ajuda de outra enzima, a telomerase, haveria um encurtamento progressivo
dos cromossomos à medida que as gerações de células se sucedessem. Se
isso ocorresse, os cromossomos atingiriam prematuramente um limite
crítico de tamanho que os tornaria instáveis, o que comprometeria o
funcionamento das células e as levaria à morte.
Sem a telomerase, a DNA polimerase só é capaz de realizar a
replicação até quase o final da cadeia, deixando um pequeno trecho sem
cópia nova. A telomerase evita essa situação esticando um pouco mais as
extremidades do DNA, o que permite então a duplicação integral das
cadeias.
Entretanto, nem mesmo a telomerase evita que, ao longo da vida de um
indivíduo, o DNA vá diminuindo gradualmente. Esse processo (a diminuição
dos telômeros) é um entre tantos outros que refletem em nível molecular
o desgaste ocorrido nas células e que leva à parada de suas funções.
A telomerase comporia assim um sistema de reparo do DNA, mas nem
sempre atuante. Ou seja, as nossas células seguem ao longo de suas vidas
um programa que compreende o equilíbrio entre reações de preservação e
de desgaste do material genético. No final, prevalece o desgaste e a
senescência daí decorrente.
Vulnerabilidade ao ambiente
Alguns dados da literatura científica destacam o fato de que esse
programa de vida das células pode ser alterado diretamente por fatores
externos, como o estresse gerado pela simples interface formada entre o
indivíduo e o seu ambiente mais imediato. Estamos assim diante de uma
situação nova, na qual se percebe que os cromossomos, que acreditávamos
estar alojados e protegidos nos núcleos das células, se revelam na
verdade como entidades bem vulneráveis e sensíveis às intempéries
ligadas a diferentes estilos de vida.
Os cromossomos, que acreditávamos estar protegidos nos
núcleos das células, se revelam como entidades bem
vulneráveis e sensíveis às intempéries ligadas a diferentes estilos de
vida
Essa associação foi mostrada por Elizabeth Blackburn e Elissa S. Epel num artigo recente da revista Nature
que revela dados impressionantes. Por exemplo, mães que tiveram que
cuidar de filhos doentes sem ajuda dos parceiros tinham telômeros mais
curtos do que aqueles de mulheres de grupos-controle. Isso vale também
para indivíduos expostos a ameaças constantes, como guerras e outros
conflitos, problemas financeiros crônicos, maus-tratos e abandono,
sobretudo em crianças.
Incidentalmente, o encurtamento precoce dos telômeros já foi
demonstrado em crianças que frequentavam cursos de alfabetização, o que
enfatiza a enorme importância de garantir que esse primeiro contato com a
escola seja cuidadosamente planejado. Já se conhece o profundo efeito
que o bullying tem na vida dos estudantes e não surpreenderia
se suas vítimas apresentassem telômeros significativamente menores que
seus colegas.
No artigo de Blackburn e Epel, há um diagrama que mostra também que o
efeito do estresse é duradouro. Ao comparar os comprimentos dos
telômeros de adultos que sofreram episódios traumáticos durante a
infância, é possível notar que o encurtamento dos telômeros é
diretamente proporcional à frequência destes ao longo da vida.
Mas nem tudo está perdido. Experimentos com camundongos mostram que o
comprimento dos telômeros pode ser revertido, o que não só traz
esperança para as vítimas do estresse como também revela uma ferramenta
para avaliar o sucesso das terapias adotadas.
Fica evidente que, longe de ser o grande ditador, o genoma de um
indivíduo é um parceiro bastante plástico, o que reforça a ideia de que a
discussão nature x nurture (natureza x ambiente) está longe de ser resolvida.
Franklin Rumjanek
Instituto de Bioquímica Médica
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Texto originalmente publicado na CH 302 (abril de 2013).
Franklin Rumjanek
Instituto de Bioquímica Médica
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Texto originalmente publicado na CH 302 (abril de 2013).
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