03.agosto.2012 08:40:38
Glossário do Mensalão: Entenda os termos jurídicos usados durante o julgamento
O julgamento da Ação Penal 470, do processo conhecido como mensalão, será composto por uma fase da sustentação oral e depois pelos votos dos ministros. A expectativa é que dure, no mínimo, 30 dias. Para esclarecer os termos jurídicos, o Estado de S.Paulo em parceria com a Direito GV esclarece os principais termos jurídicos usados pelos ministros e advogados durante o julgamento. Acompanhe:
Absolvição: A sentença de absolvição no processo penal deve ser fundamentada pelo juiz, conforme previsão da lei. A depender do caso concreto, o juiz pode absolver o acusado por entender que o fato não é crime ou incidir causa excludente de ilicitude, como a legítima defesa (art. 386, inciso III e VI, Código de Processo Penal). Também é possível a absolvição pela ausência de provas sobre a existência do fato, do cometimento do crime pelo acusado ou de indícios suficientes para a condenação (art. 386, inciso II, V e VII, Código de Processo Penal). Por outro lado, absolve-se caso seja provado que o fato não ocorreu ou que o acusado não cometeu o crime (art. 386, inciso I e IV, Código de Processo Penal). No julgamento da Ação Penal 470, a Procuradoria Geral da República pediu pela absolvição do acusado Luiz Gushiken com fundamento no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal, que se refere à ausência de prova suficiente para a condenação. A defesa pretende alterar o fundamento, para que o STF decida pela absolvição pela comprovação de que o acusado não cometeu crime algum (art. 386, IV, Código de Processo Penal).
Ação penal originária: Uma das hipóteses nas quais o Supremo Tribunal Federal exerce competência originária é no julgamento de ações penais nos quais pessoas que ocupam determinados cargos são julgadas como rés de determinados crimes específicos. É caso de ação penal originária, por exemplo, o julgamento de infrações penais comuns nos quais são réus membros do Congresso Nacional ou o Presidente da República.
Agravo regimental: É um recurso judicial previsto apenas nos regimentos internos dos tribunais para a revisão de uma decisão, geralmente pelo próprio órgão decisório que a prolatou.
Apelação: Espécie de recurso cabível contra sentença judicial para o seu reexame em instância superior, de modo que se obtenha nova decisão que confirme ou modifique a primeira.
Ato de ofício: ato praticado por funcionário público dentro das atribuições da função deste servidor. O ato de oficio é pressuposto do crime de corrupção ativa, crime no qual é oferecida ou prometida vantagem a funcionário público encarregado de praticar ou omitir ato. A prática, omissão ou retardamento de ato de ofício motivado por vantagem indevidamente recebida é também causa de aumento de pena do crime de corrupção passiva.
Ato Ilícito: É a conduta, de ação ou omissão, que é contrária à ordem e às normas jurídicas. Na esfera criminal, o fato ilícito é aquele que constitui infração penal (crime ou contravenção). Há crime quando a conduta ilícita é apenada com reclusão ou detenção; contravenção, quando é apenada com prisão simples ou multa.
Competência originária do STF: O Supremo Tribunal Federal, além de julgar recursos de processos iniciados em outros órgãos judiciais, também realiza julgamento como primeira (e última) instância judicial. Nestes casos, o Supremo Tribunal Federal exerce a chamada competência originária, como ocorre, por exemplo, na ação penal originária e na ação direta de inconstitucionalidade.
Conduta típica: Conduta típica (ou fato típico) é um dos requisitos necessários à caracterização de um crime, pelo qual uma ação humana somente pode ser punida criminalmente se a conduta estiver claramente prevista em lei penal. Por exemplo, o fato típico do crime de homicídio é “matar alguém”.
Convenção de Palermo: Trata-se da “Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional”, incorporada na legislação brasileira pelo Decreto nº 5.015/2004. A Convenção define como grupo criminoso organizado (organização criminosa) como aquele “estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material” (Art.2, a). A defesa do acusado Enivaldo Quadrado menciona a Convenção de Palermo para sustentar que o crime de organização criminosa não está definido na legislação criminal brasileira, e a única referência legislativa a respeito está na referida Convenção.
Correlação entre acusação e sentença: princípio de processo penal que exige que as decisões judiciais considerem apenas os fatos e circunstâncias expressamente descritas da denúncia. É um desdobramento dos princípios do contraditório e ampla defesa, pois limita o objeto possível da condenação aos fatos expressamente imputados ao réu na acusação, para que ele possa defender-se com efetividade durante o processo. Em outras palavras, ‘o juiz não pode prover diversamente do que lhe foi pedido’ (Gustavo Badaró, Correlação entre acusação e sentença) e tampouco decidir sobre questões que não foram debatidas pelas partes no processo. A decisão da sentença não pode estar além, aquém ou fora do pedido formulado na denúncia apresentada pela acusação.
Corrupção ativa: Crime de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para fazê-lo praticar, omitir ou retardar ato funcional (art. 333, Código Penal).
Corrupção passiva: Crime usualmente cometido por funcionário público ao solicitar ou receber vantagem indevida ou aceitar promessa de vantagem em razão da função pública (art. 317, Código Penal).
“Conditio sine qua non”: Brocado em latim que significa “condição imprescindível”. Normalmente a expressão é utilizada para expressar uma relação de necessidade lógica entre dois objetos. Por exemplo, o crime antecedente é conditio sine qua non para a configuração do crime de lavagem de dinheiro.
Depoimento testemunhal: O depoimento testemunhal é um elemento de prova, como uma perícia ou uma gravação telefônica. A testemunha tem, por isso, o dever de dizer a verdade, mediante compromisso prestado perante o juiz que toma seu depoimento. Se mentir, pode ser processada por falso testemunho, que é crime previsto no Código Penal. Já o réu (ou corréu), no sistema processual brasileiro, não presta compromisso de dizer a verdade, pois entende-se que tal compromisso cercearia seu direito de ampla defesa. O réu não precisa sequer responder às perguntas do juiz, podendo invocar o direito constitucional de permanecer em silêncio.
Diligência: termo técnico relativo a medidas tomadas dentro do processo judicial para complementação ou viabilização das pretensões das partes. Nesse sentido, o Oficial de Justiça realiza diligência quando entrega citação ao réu, ou ainda, são diligências, por exemplo, a oitiva de testemunhas, o bloqueio da conta bancária de um réu, uma busca e apreensão ou uma perícia no local de um crime.
Erro de proibição: consiste no erro do indivíduo que acredita ser sua conduta admitida pelo direito, quando ela é proibida por lei. O indivíduo supõe, por erro, que seu comportamento é lícito (Mirabete, Manual de Direito Penal, Parte Geral, p. 187). A pessoa faz um juízo equivocado sobre o que é permitido fazer, de acordo com a opinião predominante em seu meio social.
Evasão de divisas: crime consistente em efetuar operação de câmbio não autorizada, com efetiva saída de moeda ou divisas do território nacional (Lei 7492/1986).
Excludentes de ilicitude e de culpabilidade: são condições expressamente previstas no Código Penal que eximem o agente de punição por uma conduta que seria, a princípio, criminosa, mas que, em vista dos fatos, perdeu sua reprovabilidade. Um exemplo de excludente de ilicitude (condições previstas no artigo 23 do Código Penal) é o seguinte: matar alguém é um crime a princípio, mas aquele que mata outra pessoa em legítima defesa (comprovada em juízo) não pode ser condenado. Um exemplo de excludente de culpabilidade (condições previstas nos artigos 20, 21, 26 e 28, §1º) é o seguinte: o furto realizado por pessoa que tenha o desenvolvimento mental incompleto, a ponto de ser incapaz de compreender a ilicitude do fato, não deve ser penalizado.
Fato Ilícito: É a conduta, de ação ou omissão, que é contrária à ordem jurídica e às normas jurídicas em geral. Na esfera criminal, o fato ilícito é aquele que constitui infração penal (crime ou contravenção).
Foro por prerrogativa de função: Garantia constitucional assegurada a algumas autoridades que determina o seu julgamento em instância diversa do que ocorreria em regra, em razão da função por elas exercida. No STF, há prerrogativa de função para os Ministros de Estado e os Comandantes das Forças Armadas, membros de Tribunais Superior e chefes de missão diplomática.
Gestão fraudulenta de instituição financeira: crime de praticar atos de gestão de instituição financeira utilizando-se de fraude (Lei 7492/1986) .
Instrução Criminal: fase do processo penal que se inicia logo após o recebimento da peça de acusação (denúncia ou queixa), pelo juiz ou tribunal, e antecede o julgamento da causa. Durante a instrução, são realizadas as providências relacionadas à produção de provas que visam a elucidar, com a maior precisão possível, os fatos ocorridos e a efetiva conduta dos acusados. Na fase de instrução criminal são produzidas provas como o interrogatório do réu, a inquirição de testemunhas, a realização de perícias, a juntada de documentos, entre outras. Essas provas dão fundamento para que o juiz ou tribunal forme sua convicção a respeito dos fatos pertinentes à acusação e à defesa.
Mútuo: empréstimo de bem fungível. Bem fungível é aquele que não é único, podendo ser substituído por outro da mesma qualidade de equivalente peso, medida ou contagem. Dinheiro ou sacos de arroz são exemplos comuns de bens fungíveis e podem ser objeto de mútuo.
Ne Bis in idem: mencionado na defesa oral do advogado Marcio Thomaz Bastos, é termo latino utilizado para se referir, no campo penal, à proibição de que uma única conduta (ação ou omissão) seja enquadrada como mais de uma infração penal. Por exemplo, se uma pessoa rouba alguém e depois a mata, ela não pode ser condenada por roubo, homicídio e por latrocínio, mas apenas por latrocínio, para que não se incida em bis in idem. Há situações distintas, nas quais crimes podem ser cumulados, o chamado “concurso de crimes”. Bastos sustentou que as condutas de lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta e evasão de divisas referiam-se aos mesmos fatos, sendo vedada a condenação cumulativa pelos diversos delitos.
Pacto de São José da Costa Rica: Marcio Thomaz Bastos fez referência à adesão do Brasil ao Pacto de San José da Costa Rica, que dá a todo réu o direito de recorrer a uma instância superior em caso de condenação. O tratado foi assinado em 1969 e ratificado pelo Brasil em 1992. Como a Constituição não prevê expressamente o duplo grau de jurisdição, o fundamento desse princípio estaria no Pacto.
Peculato: crime cometido por funcionário público que se apropria de valor ou bem de que tem posse em razão do cargo (art. 312, Código Penal).
Prescrição: encerramento de prazo para o Estado processar ou punir o acusado de um crime. Este prazo varia de acordo com a pena do crime previsto na lei ou daquela aplicada no caso concreto. O prazo prescricional tem início com a ocorrência do crime, e pode ser interrompido em determinados momentos processuais, como o recebimento da denúncia ou publicação da sentença, por exemplo. (Código Penal, art. 109).
Princípio do Contraditório: princípio constitucional (art.5º, inciso LV, Constituição Federal) que assegura a acusação e defesa a ciência e participação dos atos no processo e a possibilidade de contestá-los. Na definição de Aury Lopes Jr. (Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional), consiste ‘no direito de participar, de manter uma contraposição em relação a acusação e de estar informado de todos os atos desenvolvidos no iter procedimental’.
Princípio da culpabilidade: Essa norma, que tem natureza penal e constitucional, manda que ninguém seja punido por fato previsto como crime se não o tiver praticado com intenção (dolo) ou, excepcionalmente, sem intenção, mas com imprudência, imperícia ou negligência (culpa). O princípio da culpabilidade busca também impedir que alguém seja punido por um resultado ilícito para o o qual não tenha contribuído, por ação ou omissão. O advogado alega que a acusação a Cristiano Paz fere o princípio da culpabilidade porque busca, segundo o defensor, responsabilizá-lo apenas por ter sido sócio de Marcos Valério, desprezando a especificidade de sua atuação (produção artística e publicitária, apenas) nas empresas publicitárias envolvidas.
Princípio de não culpabilidade: consiste na presunção de que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Artigo 5º LVII da Constituição Federal.
Princípio da legalidade penal: O princípio da legalidade estabelece que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. Este princípios se desdobra de maneira específica em diferentes áreas do direito, como o direito administrativo e o direito penal. O princípio da legalidade penal é sintetizado no artigo 1º do Código Penal: “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. Por este princípio, “alguém só pode ser punido se, anteriormente ao fato por ele praticado, existir uma lei que o considere como crime” (Mirabete, Manual de Direito Penal, Parte Geral, p. 39). Da legalidade decorre o princípio da reserva legal, que consiste na prerrogativa do poder legislativo para definir crimes e penas.
Princípio do duplo grau de jurisdição: Sem expressa previsão constitucional, esse princípio determina a possibilidade de revisão de decisões judiciais por uma segunda instância. Assim, os processos podem ser reexaminados por outro órgão judiciário, a fim de garantir a idoneidade da decisão proferida e assegurar não ter havido proteção de interesses particulares.
Princípio do juiz natural: Estabelece que deve haver regras objetivas que indiquem qual autoridade judicial tem poder para processar e julgar as diferentes pessoas e matérias que podem ser levadas ao Poder Judiciário. Tais regras, chamadas regras de competência, devem garantir a independência e a imparcialidade do órgão julgador, que são pressupostos de um julgamento justo. Todas as constituições brasileiras, exceto a de 1937, contemplaram o princípio.
Quadrilha: crime de associação de mais de três pessoas para o fim de cometer crimes (art. 288, Código Penal).
Qualificadora: Circunstâncias que se agregam à figura de um crime, aumentando suas penas mínimas e máximas. Devem estar previstas expressamente em lei, e o juiz deve considerar tais circunstâncias na aplicação da pena. São exemplos de circunstâncias qualificadoras o motivo fútil ou torpe no crime de homicídio (art. 121, § 2º do Código Penal), ou a fraude no cometimento do furto (art. 155, § 4º do Código Penal).
Responsabilidade objetiva: é uma teoria da responsabilidade jurídica que dispensa elementos de efetiva conduta ou participação do autor para sua condenação. Trata-se, em outras palavras, da responsabilidade sem culpa. Essa forma de responsabilidade existe em outros ramos do direito, como o direito do consumidor, no qual um fornecedor pode ser responsabilizado mesmo sem ter efetivamente participado da venda de um produto defeituoso, mas não no direito penal. O advogado do acusado José Genoino relembrou a inexistência de responsabilidade objetiva no direito penal brasileiro. Alegando que Genoino seria réu apenas “porque foi [presidente do PT]“, e não por suas ações ou omissões.
Ausência de subsunção típica: invocada pelo advogado de Breno Fischberg, significa que a conduta do acusado não se amolda à descrição legal do crime que a acusação pretende imputar a ele – neste caso, crime de quadrilha. Segundo a defesa, o crime de quadrilha exige que pessoas se reunam com o fim de cometer crimes, mas as relações profissionais do acusado eram de natureza lícita e visavam à prática de delitos. Sem que haja perfeita correspondência entre a descrição legal do crime e a conduta provada do acusado, não há crime. Diz-se, nesses casos, que a conduta é “atípica”, porque a descrição abstrata da conduta criminal na lei é chamada de “tipo penal”.
Fonte: Estadão
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