No já histórico junho de 2013, as ruas foram
ocupadas pelos cidadãos. Foi um grito contra tudo
que está aí. Contra os corruptos, contra os gastos
abusivos da Copa do Mundo, contra a impunidade,
contra a péssima gestão dos serviços públicos,
contra a violência, contra os partidos políticos.
Dois poderes acabaram concentrando a indignação
popular: o Executivo e o Legislativo. Contudo, o
Judiciário deve ser acrescido às vinhas da ira.
Neste mesmo espaço, em 13 de dezembro de 2011,
escrevi um artigo ("Triste Judiciário") tratando
do Superior Tribunal de Justiça, o autointitulado
Um ano e meio depois resolvi consultar o site
do tribunal (www.stj.jus.br) para ver se tinha
ocorrido alguma modificação nas mazelas que
apontei. Para minha surpresa, tudo continua
absolutamente igual ou, em alguns casos, pior.
Busquei inicialmente o número de cargos. Vi uma
boa notícia. Eram 2.741 em 2012 e em 2013 tinha
diminuído para…. 2.740. Um funcionário a menos
pode não ser nada, mas já é um avanço para os
padrões brasileiros. Porém, ao consultar as
funções de confiança, observei que nos mesmos anos
tinham saltado de 1.448 para 1.517.
Fui pesquisar a folha dos funcionários
terceirizados. São 98 páginas. Mais de 1.550
funcionários! E tem de tudo um pouco. São 33
garçons e 56 copeiras. Afinal, suas excelências
têm um trabalho desgastante e precisam repor as
energias. No STJ ninguém gosta de escadas. É a
mais pura verdade. São 34 ascensoristas: haja
elevadores! Só de vigilantes — terceirizados,
registre-se — são 264. Por ironia, a empresa
contratada chama-se Esparta. E se somarmos os
terceirizados mais os efetivos, teremos muito
mais dos que os 300 espartanos que acompanharam
Leônidas até as Termópilas, longe, evidentemente,
de comparar suas excelências com o heroísmo dos
Resolvi consultar a folha de pagamentos de junho.
Fiquei só na letra A. Não por preguiça. É que
preciso trabalhar para pagar os impostos que
sustentam os salários das suas excelências.
Será que o tribunal foi isento da aplicação do
teto constitucional? Dos cinco ministros que abrem
a lista, todos recebem salários acima do que é
Vamos aos números: Antonio Carlos Ferreira recebeu
R$ 59.006,92; Antonio Herman de Vasconcelos
e Benjamin, R$ 36.251,77; Ari Pargendler, R$
39.251,77; Arnaldo Esteves Lima, R$ 39.183,96; e
Assusete Dumont Reis Magalhães, R$ 39.183,96. Da
lista completa dos ministros, a bem da verdade,
o recordista em junho é José de Castro Meira com
o módico salário de R$ 63.520,10. Os ministros
aposentados também recebem acima do teto. Paulo
Medina, que foi aposentado em meio a acusações
gravíssimas, recebeu R$ 29.472,49.
O STJ revogou o artigo 5º da Constituição? Ou
alterou a redação para: "Todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza, exceto
O tribunal é pródigo, com o nosso dinheiro, claro.
Através do que chama de aviso de desfazimento,
faz doações. Só em 2013 foram doados dezenas de
veículos supostamente em estado "antieconômico."
Assim como refrigeradores, mobiliário, televisores
e material de informática. É o STJ da felicidade.
Também, numerário não falta. Para 2013 o orçamento
é de 1 bilhão de reais. E estamos falando apenas
de um tribunal. Só para pagamento de pessoal e
de encargos sociais estão alocados 700 milhões.
Sempre pródiga, a direção do STJ reservou para a
contribuição patronal da seguridade social dos
seus servidores a módica quantia de 100 milhões
(mais que necessário, pois há servidores inativos
recebendo R$ 28.000,00, e pensionistas com R$
O tribunal tem 166 veículos (dos quais 20 são
ônibus). Por que tantos veículos? São necessários
para o trabalho dos ministros? Os gastos
nababescos são uma triste característica do
STJ. Só de auxílio-alimentação serão destinados
R$ 24.360.000,00; para assistência médica
aos ministros e servidores foram previstos R$
75.797.360,00; e à assistência pré-escolar foram
alocados R$ 4.604.688,00. À simples implantação
de um sistema de informação jurisdicional foi
destinada a fabulosa quantia de R$ 22.054.920,00.
E, suprema ironia, para comunicação e divulgação
institucional, o STJ vai destinar este ano R$
A máquina do tribunal tem de funcionar. E comprar.
Em um edital (e só consultei os meses de junho
e julho) foram adquiridos 1.224 copos. Noutro,
por R$ 11.489,00, foi contratada uma empresa de
eventos musicais. Estranhamente foram adquiridos
180 blocos para receituário médico, 50 blocos para
ficha odontológica e 60 pacotes — cada um com 100
unidades — de papel grau cirúrgico (é um tribunal
É difícil entender a aquisição de 115 luminárias
de uma só vez, a menos que o prédio do tribunal
estivesse às escuras. Pensando na limpeza dos
veículos foram adquiridas em julho 70 latas de
cera para polimento. Tapetes personalizados (o que
é um tapete personalizado?) custaram R$ 10.715,00
e de uma vez compraram 31 estiletes.
Não entendi, sinceramente, a razão de adquirir
3.360 frascos de 1.000 ml cada de álcool. E o
cronômetro digital a R$ 1.690,00? Mas, como
ninguém é de ferro, foi contratada para prestar
serviço ao STJ a International Stress Manegement
Mas, leitor, fique tranquilo. O STJ tem "gestão
estratégica". De acordo com o site, o tribunal
"concentra esforços na otimização dos processos de
trabalho e na gestão da qualidade, como práticas
voltadas à melhoria da performance institucional
e consequentemente satisfação da sociedade".
Satisfação da sociedade? Estão de brincadeira.
Marco Antonio Villa é historiador e professor da
Universidade Federal de São Carlos (SP)
ocupadas pelos cidadãos. Foi um grito contra tudo
que está aí. Contra os corruptos, contra os gastos
abusivos da Copa do Mundo, contra a impunidade,
contra a péssima gestão dos serviços públicos,
contra a violência, contra os partidos políticos.
Dois poderes acabaram concentrando a indignação
popular: o Executivo e o Legislativo. Contudo, o
Judiciário deve ser acrescido às vinhas da ira.
Neste mesmo espaço, em 13 de dezembro de 2011,
escrevi um artigo ("Triste Judiciário") tratando
do Superior Tribunal de Justiça, o autointitulado
Um ano e meio depois resolvi consultar o site
do tribunal (www.stj.jus.br) para ver se tinha
ocorrido alguma modificação nas mazelas que
apontei. Para minha surpresa, tudo continua
absolutamente igual ou, em alguns casos, pior.
Busquei inicialmente o número de cargos. Vi uma
boa notícia. Eram 2.741 em 2012 e em 2013 tinha
diminuído para…. 2.740. Um funcionário a menos
pode não ser nada, mas já é um avanço para os
padrões brasileiros. Porém, ao consultar as
funções de confiança, observei que nos mesmos anos
tinham saltado de 1.448 para 1.517.
Fui pesquisar a folha dos funcionários
terceirizados. São 98 páginas. Mais de 1.550
funcionários! E tem de tudo um pouco. São 33
garçons e 56 copeiras. Afinal, suas excelências
têm um trabalho desgastante e precisam repor as
energias. No STJ ninguém gosta de escadas. É a
mais pura verdade. São 34 ascensoristas: haja
elevadores! Só de vigilantes — terceirizados,
registre-se — são 264. Por ironia, a empresa
contratada chama-se Esparta. E se somarmos os
terceirizados mais os efetivos, teremos muito
mais dos que os 300 espartanos que acompanharam
Leônidas até as Termópilas, longe, evidentemente,
de comparar suas excelências com o heroísmo dos
Resolvi consultar a folha de pagamentos de junho.
Fiquei só na letra A. Não por preguiça. É que
preciso trabalhar para pagar os impostos que
sustentam os salários das suas excelências.
Será que o tribunal foi isento da aplicação do
teto constitucional? Dos cinco ministros que abrem
a lista, todos recebem salários acima do que é
Vamos aos números: Antonio Carlos Ferreira recebeu
R$ 59.006,92; Antonio Herman de Vasconcelos
e Benjamin, R$ 36.251,77; Ari Pargendler, R$
39.251,77; Arnaldo Esteves Lima, R$ 39.183,96; e
Assusete Dumont Reis Magalhães, R$ 39.183,96. Da
lista completa dos ministros, a bem da verdade,
o recordista em junho é José de Castro Meira com
o módico salário de R$ 63.520,10. Os ministros
aposentados também recebem acima do teto. Paulo
Medina, que foi aposentado em meio a acusações
gravíssimas, recebeu R$ 29.472,49.
O STJ revogou o artigo 5º da Constituição? Ou
alterou a redação para: "Todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza, exceto
O tribunal é pródigo, com o nosso dinheiro, claro.
Através do que chama de aviso de desfazimento,
faz doações. Só em 2013 foram doados dezenas de
veículos supostamente em estado "antieconômico."
Assim como refrigeradores, mobiliário, televisores
e material de informática. É o STJ da felicidade.
Também, numerário não falta. Para 2013 o orçamento
é de 1 bilhão de reais. E estamos falando apenas
de um tribunal. Só para pagamento de pessoal e
de encargos sociais estão alocados 700 milhões.
Sempre pródiga, a direção do STJ reservou para a
contribuição patronal da seguridade social dos
seus servidores a módica quantia de 100 milhões
(mais que necessário, pois há servidores inativos
recebendo R$ 28.000,00, e pensionistas com R$
O tribunal tem 166 veículos (dos quais 20 são
ônibus). Por que tantos veículos? São necessários
para o trabalho dos ministros? Os gastos
nababescos são uma triste característica do
STJ. Só de auxílio-alimentação serão destinados
R$ 24.360.000,00; para assistência médica
aos ministros e servidores foram previstos R$
75.797.360,00; e à assistência pré-escolar foram
alocados R$ 4.604.688,00. À simples implantação
de um sistema de informação jurisdicional foi
destinada a fabulosa quantia de R$ 22.054.920,00.
E, suprema ironia, para comunicação e divulgação
institucional, o STJ vai destinar este ano R$
A máquina do tribunal tem de funcionar. E comprar.
Em um edital (e só consultei os meses de junho
e julho) foram adquiridos 1.224 copos. Noutro,
por R$ 11.489,00, foi contratada uma empresa de
eventos musicais. Estranhamente foram adquiridos
180 blocos para receituário médico, 50 blocos para
ficha odontológica e 60 pacotes — cada um com 100
unidades — de papel grau cirúrgico (é um tribunal
É difícil entender a aquisição de 115 luminárias
de uma só vez, a menos que o prédio do tribunal
estivesse às escuras. Pensando na limpeza dos
veículos foram adquiridas em julho 70 latas de
cera para polimento. Tapetes personalizados (o que
é um tapete personalizado?) custaram R$ 10.715,00
e de uma vez compraram 31 estiletes.
Não entendi, sinceramente, a razão de adquirir
3.360 frascos de 1.000 ml cada de álcool. E o
cronômetro digital a R$ 1.690,00? Mas, como
ninguém é de ferro, foi contratada para prestar
serviço ao STJ a International Stress Manegement
Mas, leitor, fique tranquilo. O STJ tem "gestão
estratégica". De acordo com o site, o tribunal
"concentra esforços na otimização dos processos de
trabalho e na gestão da qualidade, como práticas
voltadas à melhoria da performance institucional
e consequentemente satisfação da sociedade".
Satisfação da sociedade? Estão de brincadeira.
Marco Antonio Villa é historiador e professor da
Universidade Federal de São Carlos (SP)
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