Doação eleitoral deveria ser crime inafiançável, diz Lula
Ex-presidente faz defesa veemente de financiamento público de campanha
PT foi partido que mais recebeu verba privada em campanhas para presidente depois de Lula ser eleito em 2002
Falando para uma plateia de cerca de 150 executivos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu ontem que o financiamento privado de campanhas eleitorais se torne crime inafiançável.
Em resposta a uma pergunta sobre o papel dos partidos no mundo, Lula defendeu uma reforma no sistema político brasileiro e a adoção do financiamento público exclusivo de campanha eleitorais.
"No Brasil nós precisamos priorizar uma reforma política. Eu sou defensor do financiamento público de campanha como forma de moralizar a política. E mais ainda: não só se deveria aprovar o financiamento público como tornar crime inafiançável o financiamento privado."
Hoje são inafiançáveis crimes como a tortura, o tráfico de drogas e todos os hediondos, como o sequestro.
Depois de ter chegado ao Planalto, em 2002, o PT foi o partido que mais recebeu doações em disputas nacionais. Em valores corrigidos, Lula arrecadou R$ 114,8 milhões em 2006 e Dilma Rousseff, R$ 158,4 milhões em 2010.
As empresas que mais financiaram campanhas de todos os partidos desde 2002 mantêm negócios com o poder público. A lista é encabeçada por quatro construtoras: Camargo Corrêa, OAS, Andrade Gutirrez e Queiroz Galvão.
O financiamento público de campanha é uma bandeira antiga do PT. Mas a declaração de Lula foi a condenação mais veemente feita por ele em discursos recentes contra as doações eleitorais privadas -tema sensível ao PT devido ao mensalão.
No julgamento do escândalo, em 2012, petistas defenderam a tese de que o dinheiro pago a congressistas era doação eleitoral irregular, por meio de caixa dois. O discurso foi utilizado -sem sucesso- para tentar atenuar a acusação de que se tratava de compra de apoio político.
A fala de Lula atacando o financiamento privado ocorre também após a Folha revelar que empreiteiras pagaram quase a metade de suas viagens ao exterior desde que ele deixou a Presidência.
Após sair do Planalto, em 2010, o petista tem dito que trabalhará para viabilizar uma reforma política.
A Câmara criou uma comissão especial para discutir o assunto, mas o relatório do petista Henrique Fontana (RS) pouco avançou. O texto também prevê o financiamento público, mas não fala sobre transformar doações em crime inafiançável.
Fontana disse que pretende que alguns pontos sejam votados até abril. Apesar disso, Lula disse acreditar que o projeto não deve avançar no Legislativo e defendeu a criação de uma Assembleia Constituinte para tratar o tema.
"Não acredito que o Congresso vote a reforma. Quem está lá quer continuar com o status quo. Se o Congresso não fizer uma reforma política, nós teríamos que ter uma Constituinte só para fazê-la."
O petista disse ainda que a eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República em 1994 foi "um avanço para a democracia".
Citando a campanha de Jânio Quadros à Prefeitura de São Paulo em 1985, pediu que as pessoas "tomem cuidado" com "todo mundo que usa [o combate à] corrupção como bandeira de campanha": "Ele pode ser pior do que quem está acusando", afirmou.
Lula participou, ao lado do ex-premiê espanhol Felipe González, de seminário organizado pelo jornal "Valor Econômico" sobre a crise econômica mundial.
(PAULO GAMA)
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