sábado, 13 de junho de 2015

Quartel do 2º BPMM




O PRÉDIO DO QUARTEL DA VILA ESPERANÇA

Em 1957, a Escola de Oficiais foi escalada para fazer um policiamento preventivo, das 2200 às 0400 horas, como reforço ao Segundo Batalhão de Caçadores, atual, 2° BPMM, cujo quartel era na Rua Vergueiro.
Lá fomos recebidos pelo Capitão Walton Gonçalves, comandante da Companhia da Vila Mariana: à época, a área de policiamento do 2° BC abrangia toda a Zona Leste e parte da Zona Sul, até o Jabaquara.
Distribuídos os setores, por volta da 2300 horas, chegamos a uma rua do Bosque da Saúde, cujo nome não me recordo, que ainda não era pavimentada, raras eram as casas que possuíam calçadas e a iluminação era parca.
Durante seis horas, com o Manuel Ruperes Gimenez, meu companheiro de patrulha, fizemos um eficiente patrulhamento preventivo: afora um, ou outro, gato vadio, não vimos ninguém e ninguém nos viu.
Em 1958, quando fui servir no Segundo, a situação era outra: o Governo Jânio Quadros havia feito uma reformulação na Segurança Pública da Capital, com nova divisão das áreas de policiamento. Como o Jânio não morria de amores pela Força Pública, talvez em razão das "corridas" da Cavalaria, que havia tomado quando era líder das greves da CMTC, ele entregou as áreas mais nobres ao policiamento da Guarda Civil, destinando à Força Pública as Zonas Leste e Norte.
Uma coisa boa foi feita, entretanto, ele acabou com os chamados "calças curtas", subdelegados e inspetores de quarteirões, civis, que nomeados politicamente, exerciam graciosamente funções de "autoridades" nos bairros, secundando os delegados de polícia, entregando as funções subdelegados aos sargentos e Classe Distintas, que comandavam os Postos Policiais.
O fato do quartel do Segundo Batalhão ficar, então, bem distante da área de atuação da Unidade, causava uma série de transtornos: dificultava ação do seu Comandante sobre os seus homens, ficando toda a responsabilidade pelo do policiamento aos Comandantes das Companhias destacadas, na Penha, Vila Matilde, S. Miguel e Itaquera; o deslocamento dos policiais, de suas Companhias para a Sede, para tratar de assuntos administrativos, passar pelo médico ou pelo dentista, além de comparecer às inúmeras prontidões, que então ocorriam, era extremamente difícil, pela carência dos transportes da época.
Em 1964, fazendo um extenso arrazoado sobre essas dificuldades, sugeri a construção do quartel do Batalhão, na Zona Leste. Argumentei, ainda, que a ocasião era bastante propícia, pois o Governador Adhemar de Barros sempre fora simpático à Força Pública, tendo relação de amizade com vários Oficiais, entre eles o Coronel Cantídio Sampaio, deputado Estadual. 
Muito embora a maioria dos Oficiais, que servia no Quartel da Vergueiro, não morasse na Zona Leste, a aceitação da sugestão foi bem aceita e encaminhada.
Passado algum tempo, recebi comunicado da Diretoria do Patrimônio Imobiliário, para indicar um terreno para o Batalhão. Eu já tinha na mira o terreno a ser indicado Tratava-se de parte da antiga chácara de Dona Maria Carlota, que se encontrava na posse de sua ex-governanta, Dona Olívia Oliveira. 
Eu sabia que não seria tarefa fácil conseguir aquele terreno, pois Dona Olívia não entregava os pontos sem brigar. Consta que, quando a Prefeitura pretendeu abrir uma rua na ponta de sua chácara, para ligar a Avenida Amador Bueno da Veiga com a Rua Itinguçu, melhorando o acesso aos bairros da Vila Ré, Artur Alvim e Jardim Nordeste, Dona Olívia enfrentou os engenheiros de espingarda na mão. Ela só concordou com a abertura da via, quando prometeram dar o seu nome na nova rua e que consta até hoje.
Em contato com o Patrimônio Imobiliário, arrumei um jipe emprestado do Serviço de Transporte, para buscar a funcionária encarregada de medir o terreno, que era a esposa do Dino Sani, o grande meio campista do São Paulo e da Seleção Brasileira. Ao invés de medir apenas uma parte da chácara, a simpática funcionária optou por indicar toda a área para a desapropriação.
O Governo anterior, já havia desapropriado dois pedaços da área, para construir duas escolas: a Professor Gabriel Ortiz, que dava frente para a Avenida Amador Bueno da Veiga, e a Almirante Saldanha da Gama, no lado oposto, na Rua Alicante, que teve um pequeno prolongamento para dentro do terreno, para possibilitar o acesso dos alunos. E foram, justamente, estas escolas que o Governador Adhemar foi inaugurar, embora já estivessem em funcionamento há mais de ano.
Com um dez soldados, fui esperar o governador na primeira escola. Durante as cerimônias de inauguração, vi o filho de Dona Olívia, falar alguma coisa ao governador e lhe entregar um envelope: pressenti que se tratava de uma tentativa de impedir a desapropriação do terreno. Terminada aquela solenidade, apresentei-me ao governador dizendo-lhe que eu iria cortar caminho pelo terreno até a outra escola, enquanto a sua comitiva daria a volta ao quarteirão:
_Não tenente! O senhor é a minha segurança e vai comigo: esses puxa-sacos que vão a pé – e me empurrou para o banco da frente do Chevrolet, onde também sentou.
A caminho, espremido entre os cento e tantos quilos do governador e o seu motorista, lembrei-lhe que, dezesseis anos atrás, ele havia sido o paraninfo da minha formatura de ginásio em Duartina, cujo diretor era meu pai, que também era o presidente do PSP local, o Partido do governador. Fazendo jus à fama de sua prodigiosa memória, ele perguntou de pronto:
_E como vai o Benedito Gebara? _este era o prefeito da minha cidade, quando o Adhemar lá comparecera e havia morrido há uns dez anos.
Toquei no assunto da desapropriação do terreno e ele me disse, com aquele seu jeito bonachão:
_Tenente, indica qualquer outro terreno que eu desaproprio. Este eu não posso porque Dona Olívia é amiga de Dona Leonor. A mulher está muito velha e se ela morrer por causa disso, Leonor me mata. (Dona Leonor, para os mais jovens, que não a conheceram, foi a mulher do Adhemar e uma grande dama de S. Paulo).
Durante as solenidades na outra escola, fiquei remoendo o assunto e tentando achar uma saída.
Quando o Governador dispunha-se a embarcar no helicóptero, que o levaria de volta a Palácio, abusando da minha condição de seu "afilhado", puxei-o pelo paletó e lhe disse:
_Governador! O Carvalho Pinto teve peito para desapropriar os dois terrenos destas escolas e Dona Olívia não morreu, porque ela vai morrer agora. 
_Como é que é? –disse ele de modo áspero.
Pensei: aí vem chumbo. O homem entendeu que eu estava achando que ele não tinha peito de enfrentar a mulher e o estava desafiando. Bem... Não era bem isso, mas não deixava de ser.
_ Quer dizer que estes dois terrenos eram dela?
_Sim – respondi.
_ Então o seu pedido está atendido, Tenente: vou desapropriar.
Na semana seguinte, o convidamos para comer uma feijoada no quartel da Vergueiro, quando ele assinou o ato autorizando a construção do Batalhão da Vila Esperança.
O Adhemar foi cassado em 1965 e o quartel, teve a sua construção paralisada por várias vezes, por problemas com a empreiteira responsável, sendo inaugurado somente em 1970.
Durante as obras, fui procurado pelo Administrador Regional da Penha, (Sub Prefeito), que se propôs a abrir a Rua Alicante, continuando-a até a Avenida Amador Bueno da Veiga, pavimentando-a e iluminando-a, se a Polícia Militar doasse à Prefeitura a parte necessária àquela extensão.
O Chefe do nosso Serviço de Engenharia, o Coronel Talarico, ficou exultante, pois pode fazer uma saída lateral, para o quartel e, principalmente, para o Destacamento de Bombeiro, que fazia parte do conjunto.
 
 
 
 
 Ralph




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Um comentário:

  1. Esta é apenas uma das tantas histórias do Grande Comandante RALPH SOLIMEO, legenda da Fôrça Pública e da Polícia Militar, escritas com as letras do trabalho, da inteligência e do amor a sociedade paulista.

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