sexta-feira, 8 de abril de 2016

UMA SANTA


Uma historinha, muito a calhar nos tempos atuais, de um pacato amigo meu.
UMA SANTA

Era uma noite fria de junho, já bem tarde. Após ter dado aulas no Ginásio da Vila Jacuí, guardara meu fusquinha numa garagem próxima da Igreja da Penha e voltava a pé, quando avistei parado em frente à minha casa, no outro lado da rua, um homem que eu não conseguia distinguir quem era. 
Engatilhei a "beretinha", que sempre trazia comigo quando estava à paisana, e ganhando a proteção de um poste, aguardei que o sujeito se aproximasse. Toda precaução era pouca, pois vivíamos o auge do movimento terrorista.
_ "Cabiton Rafa, é Ali. Eu bode falá cum brimo?".- foi aí que eu o reconheci.
_ " Ali falô cum dotô delegado e ele disse bra eu, que se cabiton concorda, ele entrega a bastola bru ceis e não brocessa eu".
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Ali é um desses árabes grandalhões, aí pelos 120 quilos ou mais, muçulmano xiita do Vale do Beká, no Líbano. Como todo libanês muçulmano, fazia parte da "irmandade" que dominava o comércio de móveis na Zona Leste e tinha, à época, uma loja no Largo Santa Tereza, em Artur Alvim. 
Ele estava aflito, pois eu o havia mandado prender por receptação de uma pistola Walther PP, da Força Pública, furtada de um Oficial. Após essa nossa conversa noturna, constatando que ele havia agido mais por ignorância, que por dolo, acabei por "quebrar o seu galho" junto ao Distrito Policial. A partir daí ficamos amigos.
Tempos depois, ele vendeu a loja, voltando para o Líbano, deixando o filho mais velho, que já havia feito o "serviço militar" no Hezbolah, tomando conta de uma lojinha de roupas. Todo ano ele vem para ver o filho e por aqui fica uns três meses. Nunca deixa de me visitar e trazer um "bresentinho".
Numa dessas vindas ao Brasil, nós conversávamos sobre o que estava ocorrendo no Líbano:
_ "É, Ali, situação triste a do Líbano: xiita matando sunita, os dois matando cristãos e...".
_ "Muito triste. Alá não gosta. Alá chora.
_ "Veja o caso daquela moça que se explodiu no acampamento judeu...". – e antes que eu completasse, ele dando um pulo da cadeira me interrompeu:
_ "Esse tá certo. Eles tem que morrê. Nóis conhece aquela menina: uma santa".
_." Babai dela andava muito triste, borque tudo filho mulher. Aí menina chega bra ele e fala: babai, eu qué ajudá matá judeu".
_"Babai dela fez entom um festa, chamô tudu mundo. Nóis dança, come doce, debois menina toma banho, fica linda. Bõe bastante brefume, amarra bomba no corpo. Nóis acombanha ela até que sai da aldeia. Ela vai bro acambamento judeu e exblode tudu eles".
_ "Uma santa".

Ralph


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