domingo, 13 de dezembro de 2015

A TOMADA DE CUMBICA

A TOMADA DE CUMBICA

Era uma tarde quente de sábado, de março de mil novecentos e sessenta e

seis, quando tocaram a campainha de casa.

À porta, estava o capitão Jonas Simões Machado, também morador na

Penha, comandante da CPTM, uma companhia do "DOIS DE OUROS", que

atuava enquadrada em apoio às Companhias de policiamento de área.

_ "Ralph, o Comandante Geral quer falar com você, agora".

_ "Um momento que eu vou por a farda".

_ Sem farda – respondeu-me o capitão - .Ele está nos esperando na ponte

A caminho, quando lhe perguntei do que se trata, respondeu-me:

_ É um assunto sobre a Base Aérea, que ele vai lhe explicar. Ele havia

falado comigo, pois queria que eu empregasse a CPTM, mas eu lhe disse que

quem conhecia bem o lugar era você.

Avistei o General João Franco Pontes na ponte de Cumbica, sobre a Via

Dutra: era uma figura esguia, austera, que sem ser sisudo, não nos fazia

imaginá-lo dando uma boa gargalhada; um meio sorriso, talvez. Mas era uma

_ Tenente, o capitão disse que você conhece tudo por aqui. Você conhece

bem a Base Aérea?

_   Razoavelmente, meu comandante.

_ O Governador Ademar foi destratado pelo pessoal da Aeronáutica e

conta com a Força Pública para desagravá-lo. Você acha que poderia tomar a

_Comandante, eu acredito que seja possível fazê-lo. Mas necessito de uns

dias para dar-lhe uma resposta mais precisa.

Tudo bem. Este assunto ficará somente entre nós dois. Nem ao seu

comandante você deverá se reportar.

Embora eu não acreditasse muito que a ordem para tomar a Base Aérea,

me fosse dada, não poderia decepcionar o General, que não podia pro em

dúvida a confiança do Governador na Corporação, além do mais nós

estávamos em débito com ele, pois que havia autorizado a construção do

quartel do 2° Batalhão na Vila Esperança, desapropriando o terreno que nós

havíamos indicado. Nosso Quartel ficava, até então, na Vergueiro, fora de

nossa área de policiamento.

 Já na segunda feira, pela manhã, acompanhado do Aspirante a Oficial de

minha Companhia, a bordo do meu possante fusquinha, toquei para Cumbica

percorrendo a sua lateral por caminhos de terra, chegando até próximo à

cabeceira da pista.

Naquele tempo, não havia o Aeroporto Franco Montoro e nem as

inúmeras vilas que o cercam. Toda a Base Aérea ficava no meio de um grande

descampado, onde a garotada ia empinar papagaio, ou bater bola e os

marmanjos armavam seus alçapões na esperança de apanhar alguma coleirinha

Pouco fomos notados pelos sentinelas, pois estavam acostumados com a

presença de carros nas proximidades onde "corretores", volta e meia,

apareciam para tentar empurrar um "belo terreno" para algum cliente

Assim pudemos observar tranquilamente o sistema de rendição da

guarda: um cabo num jipão, percorrendo as laterais da pista, ia fazendo a

substituição das sentinelas, guarita por guarita, até a última e retornava pelo

mesmo caminho até o Corpo da Guarda.

Como ainda não estávamos no período do terrorismo, a segurança da

Base não havia sido reforçada. A partir das seis da tarde de sexta feira era uma

debandada geral: só ficavam no quartel o pessoal de serviço, os presos ou

detidos e alguns poucos deserdados, que não tinham para onde ir.

Em linhas gerais, pretendia atacar na madrugada de sábado para

domingo, com um pequeno grupo a paisana, como se fosse um bando de

subversivos, aguardando o jipão da rendição na última guarita, prendendo os

soldados que haviam sido rendidos, vestir meus homens com a farda deles e

retornar tomando guarita por guarita até o Corpo da Guarda e depois as

demais repartições e serviços, entregando, pela manhã, a Base para a tropa

designada pelo Comando Geral para ocupá-la.

À tarde fui ao gabinete do Comandante Geral e lhe expus um esboço

_ "General, acredito ser possível tomar a Base, sem grandes

complicações, agora, o que se fazer com ela depois, creio que já não seja

problema meu. Para isso eu vou precisar de uns quarenta homens de minha

confiança, transporte, rádios e alguns outros meios".

O General Franco Pontes disse-me que a idéia não era manter a posse da

Base, mas apenas fazer uma demonstração de força, que informar o

Governador e voltaria a me chamar.

Dois dias depois fui chamado e informado que o Governador agradecia

nosso empenho, mas havia aceitado as desculpas da Aeronáutica, não sendo

preciso mais a nossa intervenção.

Pouco tempo depois o "velho Ademar" era cassado e a Tomada de

Cumbica foi mais uma daquelas aventuras que quase aconteceram no meu

tempo de Força Pública.

Ralph Rosário Solimeo

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